sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Mindu - Um rio que passou em minha vida


Há tantos assuntos acumulados no ano para comentar, mas as imagens do Mindu são fortes e cutucam o meu silêncio.
O Mindu é o principal igarapé que corta a área urbana de Manaus, desaguando no Rio Negro. Não apenas percorre a cidade como também tem atravessado a vida de muitas pessoas, como a minha e da minha geração.

Ainda guardo na memória, a primeira vez que nadei em um rio. Foi no igarapé do Mindu que passava pelo sítio da minha avó materna, Dona Brazia de Mello Sá Peixoto, onde ia raramente, em momentos especiais da família. Localizava-se em uma área de mata fechada, longe do Centro para época, com difícil acesso por uma única e lamacenta picada ou trilha.

Devo confessar que tive muito medo ao vê-lo. Impunha respeito - era volumoso e barulhento. Aproximei-me da margem juntamente com alguns dos meus irmãos e coloquei o meu pezinho bem devagar naquela água escura e gelada. Levei um choque, afastando-me rapidamente. No caminho, o meu irmão Babal (Raimundo Arkbal) levou-me de volta ao rio, onde lá estavam, em completa bagunça coletiva os primos, primas, tios e tias e conhecidos.

No meio da brincadeira, já em segurança dentro de uma bóia de pneu velho, um grito forte paralisou minhas braçadas e silenciou o almoço dominical. Era a Dinda (Carmen Marcos Fradera) apontando para o meu irmão Luis Balkar, então com 3 anos, sendo levado pela correnteza. O silêncio foi rompido com uma gritaria difusa, na qual se destacava a voz da tia Teté (Terezinha), esposa do tio Antônio Gonçalveis de Sá Peixoto Neto. Lembro-me como se fosse hoje, do olhar sereno e terno de minha mãe, Maria do Céo Sá Peixoto Pinheiro, torcendo pelo seu irmão Balark Sá Peixoto e pelo seu cunhado Silvino Lins, marido da Docinha (Adelaide Eudoxia) e pela Celina resgatarem o rebento. A confusão não me permitiu registrar o verdadeiro herói ou heroína do final feliz.
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Anos mais tarde, menina ainda, frequentava um dos melhores "banhos" da cidade, o Balneário do Parque 10, onde havia uma piscina rústica construída no meio do Mindu. "Banhos" eram assim chamados os balneários de rio em Manaus.

Aos domingos, o Balneário do Parque 10 era sempre lotado, e apesar da quantidade de gente ninguém reclamava da qualidade da água, sempre corrente, fria e limpa. Era época em que eu e minha irmã Diana "segurávamos vela", obrigadas a acompanhar a irmã mais velha Maria das Graças e o namorado Eugênio nos passeios aos banhos do Mindu, como o Parque 10 e o Guanabara.
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O tempo passou, a Graça casou-se com o Aldo Costa e o Eugênio com a Naná Soeiro, mas o Mindu ficou. E parece que ficou sozinho.
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O Mindu faz parte da memória familiar, demarcando não apenas áreas mas sentimentos que ficaram impregnados na lembrança, constituindo-se em um bem imaterial da família Sá Peixoto e da cidade de Manaus. Os tios Balark e Silvino não passam mais por ele, mas o Babal passa, e como passa. A Dinda ainda passa mas o enxerga com os olhos da Diana e o Dr. Eugênio D'Albert continua passando e ajudando às pessoas a vê-lo melhor.

Infelizmente o Mindu é percebido por poucos da família, principalmente os mais novos, que o vêem como um grande esgoto a céu aberto, como uma evolução "natural" do desenvolvimento. Outros, indiferentes o cruzam a caminho da vida, como o Luis Felipe, filho daquele irmão que quase morreu no sítio da vovó.

Somente uma pessoa percebeu o Mindu intensamente, em várias dimensões - a Celina, a garota do Piteco, como era chamada pela minha avó a índia da etnia Sateré, que cuidava do sítio. Morreu solitariamente, e com ela estão enterradas muitas histórias e lendas do rio, que não tivemos o cuidado de registrá-las, como uma forma mais nobre de agradecimento.
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Cresci, ganhei o mundo, e ao retornar a Manaus, passei a morar muito perto do lugar onde era sítio da vovó. O sítio, não existe mais há muitos anos, e no seu lugar foi construído o primeiro COHAB de Manaus - Conjunto Residencial Castelo Branco. Mas, o Mindu ainda está lá, a poucos metros da minha casa, serpenteando o populoso bairro do Parque 10 de Novembro.

Todo dia passo pelo Mindu. Mesmo sem passar por ele, ele passa por mim. Contudo, há um momento muito especial toda vez que lentamente o atravesso com minha bicicleta e o contemplo à distância, do alto da ponte na Avenida das Torres. A brisa leve e mal cheirosa do Mindu agonizando, me remete ao olhar da minha mãe naquele episódio do sítio da vovó, talvez querendo mandar-me um recado para manter a serenidade e a ternura nos momentos difíceis.

PS: Veja neste blog mais fotos do Mindu, em artigos de novembro/2009

6 comentários:

MARIA TEREZA disse...

Adorei Neidinha.
Esse igarapé faz parte da vida de todos o manauaras da nossa geração. Lembro muito bem quando ia ao Guanabara. Tinha mêdo de entrar na piscina pois achava enorme comparada a do Bosque Clube.
Do "banho do do Tio Zé" nada restou. Hoje é o Morada do Sol e não existe vestígios do balneário que frequentávamos.Lembro que íamos aos domingos de rural willys.

Arkbal Villar disse...

Neida, gostei muito. Acho que você não sabe, mas o tio Ernani tinha um terreno uns duzentos metros da Paraíba, no sentido do Coroado. E o igarapé, evidentemente, era o Mindú. Como eu brinquei por lá. Do sítio da vó Brasia eu não tenho idéia, apenas sei das histórias. Um beijo. PS: Pela teu relato dá para concluir que o papai foi um salvador de primos. Além do Luís, teve a Lívia e a Juliana, se eu não estiver enganado. Um Bj.

Arkbal Villar disse...

Neida, gostei muito. Acho que você não sabe, mas o tio Ernani tinha um terreno uns duzentos metros da Paraíba, no sentido do Coroado. E o igarapé, evidentemente, era o Mindú. Como eu brinquei por lá. Do sítio da vó Brasia eu não tenho idéia, apenas sei das histórias. Um beijo. PS: Pela teu relato dá para concluir que o papai foi um salvador de primos. Além do Luís, teve a Lívia e a Juliana, se eu não estiver enganado. Um Bj.

Andarilha disse...

Tereza e Bal o Mindu tem muitos historias que precisam sair do papel. Obrigada pelos comentários.

maira disse...

Nossa me emocionou.. estou fazendo um trabalho sobre o igarapé.. com certeza seu relato entrará na apresentação! :*

Anônimo disse...

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